27 de setembro de 2012

All's well that ends well

Editora Penguin
Ler Shakespeare no original parece algo complicado, mas não é. A questão é que ler teatro não é tão fácil assim - porque muito do que se passa está nas entrelinhas dos diálogos. É preciso soltar a imaginação, ver a cena, ir conhecendo os personagens e recriando o ritmo e as inflexões das falas para realmente entender a história. É um mergulho num universo diferente que é construído por sua própria mente - enquanto ao assistir uma peça, você mergulha na mente de quem montou aquela história.

Essa peça, "Tudo está bem quando acaba bem", tem uma trama bem simples, resumida basicamente em uma mulher procurando conquistar o homem que ela ama. Parte da história se passa na França e parte da história se passam em Florença e é incrível como poucas referências bastaram para o autor do livro do post anterior para localizar tão bem na Florença atual os lugares em que Shakespeare colocou seus personagens.

Se você leu nada em teatro, vale a pena aventurar-se. Pode não ser o seu estilo favorito (não é o meu), mas vai ser uma outra experiência de leitura, com certeza.

22 de setembro de 2012

The Shakespeare Guide to Italy

Editora Harper Perennial - Capa Milan Bozic
Foi absolutamente irresistível ler um livro com o título "O Guia de Shakespeare para a Itália" - imaginem que o autor, Richard Paul Roe, viajou pela Itália procurando as referências que ainda estão lá nas peças "italianas" de Shakespeare.

Muitos estudiosos acreditavam que ele nunca tinha ido para a Itália, mas escreveu sobre esse país de "ouvir falar", cometendo vários erros (como ir de barco de Verona até Milão, duas cidades não litorâneas). O que Richard Paul Roe provou, através passeios, estudos de geografia e documentos, que o autor bardo não estava errado, ele descreveu exatamente o que viu no século XVI, mostrando também um profundo conhecimento cultural da sociedade da época (e que existia sim uma via aquática entre essas duas cidades, incluindo canais artificiais próprios para a navegação, que é utlizada em Dois Cavalheiros de Verona).

Embora algumas construções e lugares não existam mais da maneira como eram antigamente (como Messina citada em "Muito barulho por nada", que foi totalmente destruída depois de um terremoto e hoje está reconstruída), muito ainda permanece, como os bosques de sicômoros onde Romeu estava em Verona, ou mesmo uma boa aposta para a casa de Bianca e Katherina de A Megera Domada.

Um ótimo livro para levar numa viagem para a Itália e se espantar com o incrível Shakespeare que, além de escrever histórias ótimas, foi atencioso com os seus mínimos detalhes.

17 de setembro de 2012

Mil dias na Toscana

Editora Sextante - Capa Raul Fernandes
Não dá para ler "Mil dias na Toscana" sem ficar com muita fome. Escrito por Marlena de Blasi, chef de cozinha, ela descreve tudo o que cozinha, o que vê cozinhar, o que come na sua temporada na Toscana com o aparente único objetivo de nos dar água na boca. É um tal de falar de pão assado crocante, azeites de produtores locais, carnes marinados nos vinhos, massas caseiras, cozidos, sopas, pecorino, pães com uvas, doces fritos, mascarpone -  e vinho, muito vinho - que é impossível passar incólume. Ela passa algumas receitas, mas eu sei que não será possível reproduzir aqui, sem a carne de javali caçada na hora, os feijões frescos, o forno a lenha ou a fogueira no quintal, os sabores e aromas da Toscana. É preciso agendar uma viagem e ir para lá.

O pano de fundo - sim, porque na Toscana o essencial é a comida - é a mudança que essa americana faz com seu marido italiano da cidade de Veneza para o interior rural e as personagens que eles encontram lá. É uma história real, que começa com eles se apaixonando na meia-idade apesar das diferenças culturais contada em "Mil Dias em Veneza", que eu ainda não li. O inusitado é que não se trata de mil dias realmente, mas o livro faz um ciclo de Verão - Primavera - Outono - Inverno, percebendo que ainda existem pessoas que se acomodam com as estações como se mudassem a dança ritmos diferentes de música. Afinal, há um tempo certo de colher uvas ou azeitonas, recolher castanhas ou trufas, ver renascer as verduras após a temporada branca do inverno. Comida está no centro de tudo, e precisamos aproveitar as coisas boas da vida.

12 de setembro de 2012

Decamerão


A primeira coisa que eu fiquei sabendo sobre Decamerão é que era um livro da idade média proibido pela Igreja Católica (o famoso Index). Mas também é um clássico da literatura mundial, então eu fiquei interessada em ler, claro.

O livro reúne 10 jovens, 7 mulheres e 3 homens, que fugiram da peste que se espalhava pela Europa e, todo fim de tarde, cada um contava uma história - isso por 10 dias. Então, o livro é grandinho, mas são mil contos curtos. O fato é que eles eram muito realistas para o século XIV, mas dificilmente vão escandalizar qualquer jovem adulto do século XXI (e sim, claro, alguns realmente tem conteúdo sexual).

Além disso, não é uma daquelas obras difíceis de ler só porque tem quase 700 anos. Se houver oportunidade, mesmo se não for ler inteiro, vale a pena ver alguns desses contos de Boccaccio para conhecer um pouco da cultura italiana, ou melhor dizendo, europeia da época feudal.

7 de setembro de 2012

O avesso da vida

Editora Companhia das Letras - Capa Jeff Fisher

A proposta desse livro é inusitada: a cada capítulo, a narrativa volta e muda um ponto crucial da história, que é o que dá vontade de fazer com a nossa vida, às vezes - não em escolhas, mas em fatos grandes - o que aconteceria se fulano não tivesse morrido?

Se fosse só isso, o livro seria simplesmente uma viagem, mas o autor Philip Roth resolve mergulhar nas questões de identidade judaica, e aí, para o leitor brasileiro, o livro se torna realmente uma viagem. O núcleo principal são de judeus norte-americanos, mas há também uma viagem para Israel e para a Inglaterra, e há uma reflexão e discussão sobre o papel e a posição dos judeus no mundo, do ponto de vista de diferentes personagens. A história se passa cerca de 30 anos atrás, então, está muito mais próxima das guerras que consolidaram o território de Israel no pós-guerra.

Esse foi a leitura do clube do livro, e realmente não houve muita empatia, apesar dos pontos interessantes que ele pode aborda. Parece que há outros bons livros desse autor (super prestigiado nos Estados Unidos), mas acho que ele vai demorar para voltar a minha lista de leitura.

2 de setembro de 2012

So much for that

Editora Harper - Design por Kate Nichols
Eu posso dizer com certeza que esse é um dos livros mais depressivos que eu já li em toda minha vida. "Tempo é dinheiro", numa tradução meia-boca para "So much for that" consegue colocar tanta desgraça junta, que, em certo momento, não dá para saber se alguém - ou se você mesmo - irá sobreviver. Eu comecei a ler, parei, voltei, parei, voltei e - finalmente - acabei de ler. Como a própria autora, Lionel Shriver, diz em seus 10 motivos para ler esse livro o final é alegre em certo sentido, então há esperança para quem está lendo. (É um spoiler não específico, mas em certos momentos você precisa saber que há uma luz no final do túnel, senão é realmente insuportável.)

O livro escancara em suas páginas assuntos familiares complicadíssimos: uma criança com uma doença degenerativa genética incomum, uma esposa com um câncer raro de mortalidade alta, um idoso que quebra uma perna e vai para um asilo por falta de quem tome conta. Mas isso não é o suficiente, porque o ponto é justamente o dinheiro e quanto vale uma vida. O quanto você pode pagar de hospitais, asilos, médicos, procedimentos, remédios para manter alguém vivo? Mais do que você pode, o que você deve pagar? É um assunto extremamente delicado, e apresentado pela autora de uma maneira crua e direta. Realmente de entristecer - até pela proximidade: o câncer, o idoso, estão logo ali, do nosso lado, entre nossos amigos, nossos familiares e quem sabe um dia, até nós mesmos. Como nós iremos agir?

Por outro lado, eu refleti também sobre o que a nossa fé (ou nossa concepção de mundo que seja) pode mudar muito a maneira como encaramos as adversidades que acontecem em nossa vida. Esses personagens, em sua maioria, não tinham nada a se agarrar - o que acontece depois da morte, porque estamos aqui, qual o próposito da nossa vida. E eu não posso evitar pensar que, por eles não terem boas respostas para isso, o mundo estava tão branco e preto nos momentos de crise.

É um livro dolorido, tenso, embora tenha sim seus momentos leves e divertidos (raros, na minha opinião), mas é daquele tipo que não vai deixar você incólume.