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Editora Record |
Eu adoro histórias da Inglaterra no século XVIII e XIX - por essa afirmação, entenda-se Jane Austen e Charles Dickens. Quando eu vi esse livro para vender, Middlemarch, um tijolo de quase 900 páginas de George Eliot, contemporâneo a esses meus escritores favoritos, por uma verdadeira pechincha (12 reais), não resisti a levar para casa e esperar que um momento oportuno de leitura se apresentasse.
Aí eu descobri que George Eliot era um pseudônimo de Mary Ann Evans e aumentei ainda mais minhas expectativas - em ler um romance delicioso. No entanto, ao começar a ler, fiquei decepcionada - um pouco pelo estilo da autora e um pouco pela tradução (palavras rebuscadas e antiquadas, frases longas, muitas tramas paralelas em que os personagens eram apresentados com muitos detalhes). Foi muito difícil encarar as primeiras 150 páginas, então deixei o livro de lado e achei Guerra dos Tronos, e só depois de superar a minha dependência direta aos livros de George. R. R. Martín, consegui voltar para esse tijolinho (que provou porque custava tão barato ao ir descolando da lombada por pura manipulação de leitura).
Depois o enredo me ganhou, sendo o estudo realmente das relações humanas de uma pequena vila, as interações sociais entre os diferentes tipos, e mesmo os relacionamentos conjugais que se apresentaram. O olhar de George Eliot é realmente mordaz para nos levar a realidade de uma sociedade que não mudou tanto assim em sua essência nos últimos 200 anos. (Mas confesso que considerei exageradas as descrições do conhecimento médico da época e da situação política, contudo sempre há quem se interesse!)
Eu gostei particularmente de algumas passagens sobre o comportamento feminino e conjugal, que eu anotei para compartilhar com vocês.
"Deste modo, os primeiros meses de casamento são com frequência tempos de tumulto crítico - seja num lago raso ou em águas profundas - que depois se acomodam no regozijo da paz."
Dorothea, ou Dodo é uma jovem viúva sem filhos. Celia é sua irmã, casada com Sir James, mãe de um bebê novinho, Arthur. Os próximos trechos se referem a momentos entre Dorothea e Celia, depois da primeira passar uma temporada com a segunda, que está absolutamente encantada por seu filho.
"Depois de três meses, Freshitt se tornara um pouco opressiva: não daria certo sentar-se por várias horas do dia, como um modelo de Santa Catarina, a olhar em êxtase para o bebê de Celia, e manter-se em presença deste portento com desinteresse persistente era uma atitude que não iriam tolerar numa irmã sem filhos. Dorothea bem que seria capaz de carregá-lo alegremente por até mais de um quilômetro, caso houvesse necessidade, e de amá-lo com mais ternura ainda, tendo em vista o esforço; mas para uma tia que não reconhece como Buda seu sobrinho infante, e nada tem a fazer por ele, a não ser admirá-lo, o comportamento de um bebê pode parecer monótono, e o interesse em observá-lo, esgotável."
"Agora, Dodo, dizia Celia, ouça o que diz o James, porque senão você cai numa enrascada. Sempre o fez, e sempre o fará, quando resolve agir como lhe agrada. Acho que agora é afinal uma benção que tenha o James para pensar por você. Ele deixa você ter os seus planos, somente lhe impede de enredar-se neles. E esta é a vantagem de ter um cunhado ao invés de um marido. Um marido não deixaria você ter os seus planos."
Engraçado, não? Imagine-se num mundo desses!